Pedalando até o Príncipe Encantado

Nos últimos  3 anos já pedalei – frouxo! – mais de 8 mil quilômetros…troquei de trabalho, dei a volta no mundo, nadei de um continente ao outro…conheci muitas pessoas, fiz novos “velhos” amigos… E se números podem impressionar, a mim impressiona e encanta mais toda a diversidade e aprendizagem desta vivência.

Mas, voltemos a bike, que além de me levar longe, tanto me ensina. É difícil segurar a empolgação quando começo a contar as minhas aventuras como cicloturista… algumas pessoas me olham atentamente, como que hipnotizadas pelo brilho que deve saltar dos meus olhos; outras, presas aos “pré-conceitos”, fazem a pergunta derradeira. Fazem a pergunta que não quer calar. Fazem a pergunta que devo ter ouvido tantas vezes quanto os quilômetros que pedalei: “Mas você faz tudo isso sozinha? Você não tem medo?”. Infeliz ou felizmente, a resposta tem sido a mesma há muito tempo – para os dois questionamentos! E para quem tem coragem de ir além de um “sim-não” eu sigo minhas narrativas falando de toda a beleza que existe e que eu nunca teria experimentado se permanecesse na “segurança” da minha janela, a espera do príncipe encantado que – é óbvio! – no meu caso trocaria o corpulento cavalo branco por uma “magrela” de duas rodas, movida a músculos e sonhos. É claro que viver dá medo…mas é tão bom!

Sei que é até poético – a “ciclista solitária”: eu, minha bike, minha cestinha, todo um horizonte pela frente e “só” Deus para conversar – mas não é o que eu sonhei, contudo é o que eu tenho e o que depende de mim e, se eu não fizer a minha parte, como posso esperar que as coisas aconteçam? E, se nunca acontecerem… por acaso seria justo ou coerente não reconhecer toda a beleza e abundância inquestionáveis que têm o mundo? Não. Para mim não. E nesta hora lembro de um pedal que fiz na Argentina e que, só para variar, me permitiu descobertas incríveis. Em uma delas, acabei dentro de uma igreja, escutando o sermão dominical e bem na hora que me ajeitei em um cantinho, o padre disse: “aos desafios e inquietações da vida, qualquer que seja a tua resposta – que não a própria vida!!! – a resposta é inútil, frágil, incipiente”.  Não preciso dizer que isto calou fundo, mas foi o que eu precisava ouvir, o que eu ensaiava há tempos, e o que tornou-se prática desde então, que todos os dias firmo e reafirmo, com a própria vida”.

Sim, eu pedalo sozinha. Não porque quero, mas porque é o que eu posso. E eu poderia apenas dar a volta na quadra, mas escolho 100 km de curvas e subidas rumo à serra e as cachoeiras gaúchas, não porque seja fácil, mas porque me faz feliz…e é tão simples, só depende de mim, da minha vontade, da minha perna, da minha disposição.  Eu só preciso tentar, metro a metro, quilometro a quilometro… simples assim. Não tem nada de super mulher, super atleta, como alguns insistem em rotular. É simples, basta querer… E a cada curva da estrada eu descubro uma nova flor, sinto um cheiro diferente, observo que a vida é perfeita e que com certeza sou parte dela, mereço tudo que há de melhor… e se os frutos que sonho ainda não vieram é porque, em algum canto ou floresta do mundo estão, assim como eu, em processo de maturação. De coração, não tenho mágoas ou ressentimentos quanto à espera, pois observo na natureza que tudo tem o tempo exato. E o pedal ensina que sentir a vida em outro ritmo é muito mais gostoso, pois é possível explorá-la com intensidade, com todos os sentidos. Pedalando – sozinha, por enquanto  – respondo com minha vida, tal com me desafiou o pároco portenho, que o caminho não está feito, mas se faz ao andar…ao andar para frente, com os olhos repletos de chão e com a gana de ser sempre melhor.

Não, não tenho medo. Tenho respeito, é bem diferente. Sei de riscos, mas também sei que eles são inerentes à própria vida… existe até uma brincadeira que diz que a única certeza da vida é a morte. E com certeza o caminho vale à pena e muito melhor que chegar, é se superar.

Sim, pedalo sozinha, sem medo, a espera do príncipe encantado – não parada – mas esperando que ele me alcance! E é fundamental que ele me alcance, pois isto significará que ele também se deleitou e valorizou cada metro do caminho… Afinal, se quero que ele venha de bicicleta, tenho que confiar em Albert Einstein, que afirmou que “a vida é igual a andar de bicicleta. Para manter o equilíbrio é preciso se manter em movimento.” Quem sou eu para contestar um dos maiores cientistas de todos os tempos? Viva Albert Einstein, viva a bicicleta e viva o meu príncipe que “há-de-vir”!

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