Mais humanos

De repente, me dei conta…a pandemia está nos tornando mais humanos. Sim. Exatamente isto. Mais humanos, como deveríamos sempre ser, desde o Princípio.
Primeiro, pelo motivo óbvio: nunca tivemos tão clara e próxima a certeza de que somos finitos. Somos humanos, logo, mortais. Antes podia até existir a ilusão ou delírio de que podíamos ser invencíveis ou que dinheiro e posses poderiam garantir longevidade. Hoje as notícias são claras: o vírus mata sem piedade e algumas vezes põe ricos e pobres na mesma fila, à espera de um leito ou de oxigênio. O inimigo é invisível e minúsculo e dinheiro nenhum no mundo até então conseguiu vencê-lo. É também uma questão de lógica ou matemática: não há mais quem não conheça alguém que partiu…

Volta e meia eu falo em tom de brincadeira que quando enfim este momento de pandemia passar sairemos as ruas e ao encontrar alguém conhecido nos festejaremos como sobreviventes e faremos a contabilidade de quem não está mais entre nós. Se pensarmos em filmes, seria um misto do Náufrago com Forrest Gump e qualquer um daqueles filmes apocalípticos, em que os ícones das grandes metrópoles vão ruindo sem piedade  e só os protagonistas sobrevivem. Seria como sair da caverna de Platão e ver com espanto e encanto o tudo que o mundo mudou.

 Foi justamente com este pensamento prévio que hoje a ficha caiu. Ao voltar da feira de bicicleta como todo sábado, encontrei na rua um garoto que costumava  encontrar de noite passeando com o cachorro quando eu voltava para casa também de bike. O cachorro latia e este era o nosso “diálogo”. Hoje quando ele me viu, não escondeu a felicidade, perguntou como eu estava, confessou ter percebido minha ausência e quando eu respondi que apenas tinha mudado meus horários, mas que seguia sempre pedalando ele  ainda me deu os parabéns pelo meu empenho e perseverança e desejou um ótimo final de semana. Um pouco mais adiante me dei conta que toda a efusividade do garoto muito provavelmente era o alívio de constatar que aquela moça louca que encarava a subida íngreme e ainda se esquivava do cachorro não tinha virado mais um número na estatística da pandemia. E é nisso que estamos mais humanos: em slow motion estamos vivendo como se não houvesse amanhã. Estamos declarando amores, reverenciando o caminho e distribuindo sorrisos ( velados pela máscara mas brilhantes nos olhos!) por que hoje pode ser a última chance. Sei que soa dramático, mas é real, é humano! Que bom.

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