
Violada. É assim que eu me sinto. É bem verdade que nos ultimos tempos eu vinha abusando da carcaça e até da mente: muito trabalho, pouco sono e péssima alimentação – justo eu que sei tão bem a diferença que ela faz! Ah se não fossem aquelas 2, 3 horinhas de deslocamento mágico sobre duas rodas eu acho que já teria entrado em curto circuito há muito tempo! Certo. Mas pirar é uma coisa: é sujeito, é voz ativa! E ser violada é bem diferente: é passivo, sem opção…é estar encurralada.
De repente este “bicho” entrou no meu corpo, limitou meus movimentos, nublou meus sonhos e mexeu até com minhas luas….parou tudo! Fez eu me sentir completamente fora do controle. Com grande desconforto fico de pé, chego até a porta, olho para o jardim e me sinto a qulômetros luz da natureza…ele quebrou minha conexão.
Fui violada. E de repente, o tempo que anda a tão escasso, tornou-se infinito. Eu viro e reviro na cama e os ponteiros não andam. As horas se arrastam, os dias se multiplicam e eu sigo inerte…o relógio da cozinha – talvez de susto – até parou!
Foram uns 3 dias lutando com os sintomas até que eu desci da bike e cai na cama. Dois dias – providencialmente no final de semana – que eu dormi em exaustão que não senti nem nos meus mais longos, desafiadores e inclinados dias de cicloturismo. E eis que na segunda-feira, quando avisei que as forças que estava juntando não seriam suficientes para chegar na hora em meus compromissos, recebi a notícia de mais “positivos” próximos. Desviei então para a emergência e fiz o PCR. Umas 36 horas depois veio a bomba: “POSITIVO”.
Li e reli mas estava ali, claro e inquestionável(e em 2 idiomas!): POSITIVO. Nunca uma palavra me pareceu tão contraditória! Como assim? Eu isolada, toda dolorida, imobilizada e a vida galopando lá fora? O que tem isso de positivo? Perder um evento pelo qual esperei mais de 2 anos para trabalhar? Como pode ser positivo perder assim as rédeas da própria vida e da vontade própria? Me sinto um saco de batatas, daqueles que não se ajeitam mesmo: nem rolam nem se encaixam…
Como se não bastasse a constatação de que somos apenas 10% humanos, ainda sou violada por um vírus que pára tudo e toma o controle? Ah, não!
Me sinto ingrata por lamentar meu diagnóstico…me sinto traída por ter que retornar ao hospital e fazer mais exames para descartar uma pneumonia. Eu? Três doses, sem comorbidades e quase uma tri atleta? Enquanto recebo medicação na veia, é difícil lembrar o copo meio cheio… e olha que eu sei que ele está lá, enchendo sempre… Fora esta rasteira do Positivo, sou uma sobrevivente! Existe vitória maior do que a vida? Sei que não. Mas mesmo assim dói. E muito.
E de todas lições que a pandemia tem me dado, esta vai ficar tatuada na alma: em caso de violação, lembre-se de quem você é e retome seu caminho com todo seu sangue e suas células.
Força aí, querida! Aqui em casa também fomos premiados com este resultado; isso sem sair de casa exceto para assuntos médicos e estritamente o necessário, com máscara sempre e álcool em tudo sempre.
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